Colaboradores

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Xerazade

Vai ser outro dia assim que fechar a porta
e nem cantou a cotovia

Virá o mundo até nós com seus juízos
e ninguém pergunta

tudo à revelia e Ás de espada

Então tenho de te contar uma história
de artimanhas sem desfecho

Era uma vez
Fecha a janela, está frio
Não, não ouvi nada

Uma mulher e um homem
mas tinha um mundo
Fecha, fecha a porta

Dá-me um suspiro a mais
escuta

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Brilho eterno de uma mente sem lembranças

Três vezes. Três. Três. Aquilo voltava. Quisera tanto. Tinha sito tão bom. Não tinha? Três. Não lembrava direito. Será? Tentava pensar noutra coisa. Precisava terminar o projeto, e as unhas estavam horríveis. Não conhecia aquele homem? Parecia que estava esquecendo alguma coisa. E se escrevesse de madrugada? Talvez bem cedo da manhã. À tarde não dava. Algumas coisas das tardes embrulhavam a mente. Três vezes. Lembrou. Sorriu e ficou vexada do homem que reparou. Como se não pudesse sorrir. Tanta dor, tanta mágoa, medo. E sorriu, só lembrança. Então escureceu de novo. Tinha de terminar o projeto, tinha tanto pra fazer. E depois? E depois? Depois. Espantou o temor. Podia fazer as unhas, pintar o cabelo. Caminhar sempre era bom, podia pensar. Nunca podia pensar, nunca tinha ela pra si. Pelo menos podia escolher no que pensar, embora a dor, a mágoa. Palavras. Fez força pra lembrar delas, alguma coisa, mas só sentia a pele, o calor, o gosto. Não lembrava mais de quê. Três vezes. Três só. E nunca mais. Nada mais. Três vezes. O que tinha ficado? Só coisas pra esquecer. Nada mais. Por três vezes. E agora um naco de vida, por quanto tempo? Nem sabia, era proibida de pensar. Tinha de passar no mercado. Estava esquecendo alguma coisa? Faltava alguma coisa. Estranhava. Suspirou, unhas, cabelo, mercado. Já é hora de voltar? Três vezes, e agora nem seu pensamento era mais seu. Nada era. Quem sabe agora seria sua. Pela primeira vez. Mas não sorriu. O tempo, pensou.

domingo, 2 de agosto de 2009

Aventura pictórica

Todas as paredes brancas e a cama e os lençóis. Só à cabeceira, cores de um quadro de Celma. E sexo. Amarelo e vermelho intenso como a tela . De repente não é sonho, e as pétalas de rosa vermelhas escondidas entre as páginas do livro de Nélida confessam o ato. Uma paixão que jaz memória, como leio em Coração Andarilho: Meu testemunho é impreciso, ela conta. O meu é a percepção, as cores me dizendo do sonho, do sexo e das coisas que nele pulsam. Mas fora dali tudo é branco, o corpo entre as páginas, morto. As pétalas voltam à tela, jactantes do gozo, sussurrando-me coisas. Mas é delírio e meu testemunho é impreciso.