Colaboradores

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Nada virtual

Lind@ garot@
estudiosa
não sai pra balada
trancada no quarto
poster da Lady

Alegria de vovó
lê, lê, escreve, escreve
misteriosa nas fotos do perfil

Mas
mamãe ocupada
papai não viu
e o bxu ppaum enguliu!!!

domingo, 26 de setembro de 2010

Catedral


Em cada cidade eu teço um marco

- Aqui foi o dia, aquela vez, quando eu disse

quando tu

aqui foi quando eu senti

Uma criança muito loura correu em direção à mãe

mexendo no meu estômago

Qualquer vestido na vitrine

alguém com o cigarro no canto da boca

e eu penso

penso até doer

a calçada de repente transgressora


Sou a ambulante estrangeira

vendendo perguntas silenciosas

o coração indigente estendido

pedindo explicação


Então as torres da catedral.

(ele dissera pra eu ir ao quarto andar do hotel

como uma criança no ombro do pai

- mas eu sempre me guio pelas alturas)

(eu gosto quando o balão escapa das mãos

e voa voa

seguindo seu caminho de balão)

Três quadras

da urbanidade explicadinha do interior

as gentes e as vitrines simétricas


Sou mesmo pequena

meus longos cabelos crescem quando eu olho as torres

estreitando-se como meus olhos

fico assim um pouco

- se não fossem as torres eu era louca

fecho os olhos, tonteio

a banda militar sertanejando na praça

me viro, casais dançam e fotografam


Por fora estas torres ponteagudas cinzentas

por dentro rosas vermelhas e rococó

(sorrio pensando nele)

Santa Terezinha me observa na penumbra (estética)

- decifra-me

eu me devoro

em segundos de expectativa fria


Eu rezo e ela se enternece

posa para minha fotografia

- obrigada, vou colocar no meu altar

A senhorinha das chaves está falando falando, não ouço

- santa terezinha, meu coração indigente...

- minhas perguntas...
e deposito no altar

Na rua ainda a banda o algodão doce e as criancinhas louras

as imensas portas de madeira trancadas

a senhorinha manda eu ficar com deus
amém


Tenho de voltar pelo mesmo caminho?

escolho o outro lado da rua

gentes e vitrinas simétricas
a catedral agora uma fotografia

o prédio do hotel não tem torres

pra eu me encontrar

nem rosas vermelhas

(sorrio pensando nele)

mas é lá que ergo meu marco:

no quarto

na cama

no meu homem

de braços estendidos pra mim

sábado, 28 de agosto de 2010

Revelação

Eu virei para o outro lado
queria dormir
vi meu terço de contas ainda mornas
o que tenho pra me dizer?

Fechei os olhos
Meu corpo não
O que me escondo?
O livro de Inês sob o terço

Então eu soube
Eu ouvi bem me dizer
Entrou pela minha boca
Estreitando o peito e a garganta

Fiquei ali ouvindo
Entre vibrante e pasma
Querendo o sexo
Uma oração aos pés da cama

Queria caminhar
Invisível pelas ruas
Queria um mergulho escuro e sem fim
Queria tocar o sol

Mas fiquei ali
Me ouvindo
O livro de Inês o terço e a escuridão do quarto
silenciosos
E minha boca sussurrou
Eu amo este homem
Eu amo este homem

domingo, 18 de julho de 2010

Some lonesome valley

Queria poder ter a simplicidade
De cantar Peggy Gordon – minha querida,
Sem olhar no relógio e contar as letras
Minha voz sem pensar em significados

Queria segurar minha xícara de café quente
Diante da vidraça e meus olhos perdidos no horizonte
Ilimitado do tempo
Como nos filmes fazem as moças bem resolvidas

Às vezes me dou o deslumbramento instantâneo
De pensar o que pensaria Simone
E o que sentia Virginia
Entre o enrubescer da ousadia e a pergunta sobre felicidade

Pelo menos não perguntarão da minha
Ninguém pra discutir da minha vã existencialidade
Peggy Gordon (who are my darling?)
Tell to me the very reason

sexta-feira, 25 de junho de 2010

O poema russo

A palavra sem qualquer evidência
talvez a cor da imagem
os cheiros e sons e sabores que ela provoca

A palavra e suas coisas proteladas
franzindo nossa testa
incomodando os sentidos

Depois tudo segue o rumo
o poema nas vísceras
o resto é impressão

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Isla

O quarto está cheio
de um silêncio que nem tua fala interrompe
um silêncio gritante
vozes de uma auto-explicação
tão ridícula como seria esta fotografia
agora
no quarto cheio de armadilhas
eu aqui com minhas vírgulas e meus entretantos
tu com o ar condicionado e ainda de sapatos

Vai chegar a hora do telefonema
E chaves e falta da agenda
Que fizemos nestas duas horas antes do café?
Enchemos o quarto deste silêncio gritante
Que implora por uma audiência
e aponta pra si mesmo
como a tevê numa madrugada estrangeira
tão desconcertante não entender
o que ele diz de mim

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Um pedacinho do bolo

Seis da manhã
a janela me desperta para outro sonho:
a neblina esconde as razões do relógio

Aqui dentro também
serração, o sorriso do gato
Sua tolinha! Você está atrasada.

Eu? Eu sou a errada.
Quero asas
e um pouso suave

Mas esqueça o chá
tenho outros planos
e uma conversa com a senhora do hookah

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Espelho

Entre mim e mim há certas noções
Do espaço entre esta imagem
E a face perdida na rotina

Também não sei se é gozo ou é tormento
mas
Ó, meu Deus, Cecília, esta é minha alma.
E que motivos tem ela para cantar?

sexta-feira, 19 de março de 2010

Um poema para o poeta

Ei, Charles, você foi esperto!
Não quis botar o pau no fogo
e escolheu uma mulher boa
delicada, deliciosa e magnifíca

Cara, deixa eu te dizer -
embora isso nem importe mais, não é mesmo?
Eu já fui dessas
mas agora estou recusando os espertos

Agora chama o garçom
e pede dois do mesmo
acho que ainda não estamos no ponto
de falar sobre o que desconhecemos

quinta-feira, 11 de março de 2010

Poetisa de verdade

Adélia temperando a comida em fogo brando
os líquidos suculentos, os cheiros que dançam na cozinha maculada

Adélia olhando pela vidraça, a mão movimentando a colher primitivamente
e a mão de Deus, as flores, as pessoas, os carros

Quando as narinas e o paladar - e ela prova os sabores - sabem que é chegada a hora
Adélia larga a colher, apaga o fogo, estende a toalha.
Chama a família.
Manda servir.

E vai refletir poeticamente na sala ao lado
os sabores da janela que lhe ficaram na boca

Romance

Eu preciso de romance
digam o que quiserem

Quero margaridas na manhã seguinte
e um olhar terno na próxima noite

Preciso que me leve no topo à noite
para olhar as luzes da cidade
Quero contar as estrelas com quatro mãos

Preciso daqueles bilhetinhos com duas ou três palavras
sem assinaturas, sem desculpas
Nenhum amigo que recomende rosas vermelhas

Apenas verdades românticas

Ninguém que precise de conselhos
apenas me encare, encare-se
olhos nos olhos
fogo nos olhos
leveza nas mãos firmes

e beijos sinceros

Eu preciso de romance
digam o que quiserem

sábado, 6 de março de 2010

There is a pleasure in the pathless woods

There is a pleasure in the pathless woods


Meus olhos fechados em Madison County
mas não é a Imes Bridge que eu vejo
onde as cinzas foram espalhadas

nem lembranças guardadas numa caixa
um livro dedicado a F
nem as velas na borda da banheira
e o vestido vermelho do adeus

os silêncios e as pontes
pretextos para arrastar o tempo

Há um sinal vermelho na estrada
e um instante
que atravessa a vida

A mão segura a maçaneta
chove
no retrovisor embaçado um pêndulo
avisando do tempo

A mão aperta a maçaneta
chora
e um caminho desconhecido e possível
fica pra trás

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Da imprescindível razão de ser

Lá. Bem adiante de onde vêem meus olhos, alheia à cidade. E bem ali, aqui, na sombra do maracujá enroscando-se nas grades da sacada, está a razão. E não é um sapato nem uma casa de pedra encravada na montanha. É tão convexa, estabelecida entre meus dedos, tão e tanto e tudo, que parece que me falta o ar, que tenho fome, e sede, e frio. E tudo o mais parece desnecessário e sem sentido. Dentro de mim ela morre, e mesmo assim flutua e pesa.
O ar continua entrando em meus pulmões, eu acordo de manhã, eu me deito à noite. Mas entre essas coisas que não posso deixar de fazer, tudo é oco. Rejeito todas essas sensações que eram para ser prazer – o gosto de uma castanha e mesmo o som que ela faz ao cair na grama, nos dias de sol em que o vento cochicha entre meus cabelos. E o sol, a grama e a castanha então me dizem na voz do vento – que é só disso que eles sabem: do sangue que corre em minhas veias, do oxigênio, do calor na minha pele, da chuva, da terra. E com eles eu desprezo o que não me basta.
Pra que a mordida na maçã? Quando minha boca reconhece o supérfluo, a língua repele a insipidez. O sabor me fere como um aviso de morte. E a rotina prossegue como um recado: as coisas não estão no seu lugar. Há uma mancha desbotada na mesa, um vazio do que devia estar ali. Há um silêncio no canto da sala, no quarto uma sombra fugidia que se esconde quando eu abro a porta e que pesa em mim como se subisse nos meus ombros. E as coisas viram cinza como a tumba em seu segredo revelado.
Então a língua cala, a pele dorme, o corpo se fecha – pra que azul, roxo, doce, amargo, quente, líquido, arrepio? Posso até sorrir, a tristeza tão esticada na curva que nega a si mesma. E não faz diferença. Noite? É tudo uma questão de simplesmente prosseguir, e engolir a maçã. Sem gozo.
Sem véspera, a boca seca. Sem respiração suspensa, o estômago não contrai pra despertar as mãos. Sem a gota de suor que desce na nuca, sem o frêmito. Nenhum movimento em direção à vida. Nenhuma pergunta estarrecida diante do óbvio. De olhos fechados, meu coração continua, meus pés recebem o que lhes cabe, meu corpo estático caminha.
Amanhã só o sol, medido em horas, em eterna consecução, mesmo o fim marcado em milênios. Mas que diferença faz o tempo a quem não espera? É apenas um som repetitivo escarnecendo. Importa o agora, me dizem os donos da razão. O agora é uma fração do antegozo e só serve aos que saboreiam, mas eu não respondo. Porque estou morta às perguntas e aos sabores.
A dúvida calada em meu peito nem é minha, a sombra do maracujá já me disse tudo. E aquele carro mal estacionado. O prédio. O vazio, uma corda serpenteando as ruas, as beiradas, os centros, minhas pernas, meus pulmões. Eu podia gritar, mas então eu ouviria. E eu não quero me acordar e enxergar de novo que ela morre dentro de mim.